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“Coura sem paredes” – 2017

“Coura sem paredes”, foi o que lemos algures em cartazes a embandeirar rotundas e recantos, falando de uma vila, cidade e concelho cuja relação simbiótica com o festival deixa cair por terra qualquer outro azedume dos cartazes ao lado, multiplicados em época eleitoral. A Coura é maior do que tudo isso, pois.

E feitos 25 anos do Paredes, o casamento com a terra traz milhares de apaixonados que ora descobrem renovam votos, ora descobrem o amor pela primeira vez.

As margens do Tabuão têm então costas largas para todos eles.

E se, mesmo num ano de recordes batidos, a relva e rio continuam a ser doces ao cair do sol, as noites caíam auspiciosas também.

Naturalmente. Se a quarta nos serviu de introdução em fogo lento, pautado essencialmente pelo compasso de dos eternos Mão Morta e de Kate Tempest, a quinta serviu para sacudirmos tudo de forma catártica

– e aqui a conta é simples e faz-se a três: os muito anisados At The Drive In, foram a concretização do anseio para fãs de longa data, fazendo saltar um saudosismo agudo, evocando The Mars Volta nas conversas, mas deixando todos de barriga cheia perante uma performance com Cedric Bixter aos comandos;

os poderosos H09909 e os inesperados Jambinai foram a descobertas da noite, num line-up em que King Krule ficou a meio caminho do esperado.

Sexta chegou com uma (muito feliz) novidade, merecedora clara de anunciação: a poderosa reconciliação da massa festivaleira com o jazz. Desde o nacional Bruno Pernadas que, em mote ensemble, continua a cruzar magistralmente a inspiração jazzística com o rock experimental, às sonoridades punk-gospel dos Young Fathers, chegando ao reinado de fusão dos pequenosgigantes Badbadnotgood, que puseram milhares de pessoas em estado de graça.

Houvesse espaço para um Kamasi Washington e esta noite ganharia súbitos contornos épicos, a fazer história por mais 25 anos de festival.

E porque os últimos são os primeiros, dizíamos em putos, para último ficou o senhor concerto. Benjamin Clementine.

A voz antiga, maturada com vinco, com um dom encarnado num menino autodidata que nos ensinou tanto, bem ali. Aos 28 anos, Benjamin Clementine tem uma voz que faz história, que tem memória de outras vozes e contornos como os de Nina Simone, e deu uma senhora lição de concerto de alma e voz postas a descoberto: ele, de pés descalços, desarmounos e exorcizou-nos o mal, criando um coro inenarrável para Condolence.

“Apparently we’re meant to be scared. They can do what ever the hell they want. We’re not afraid”. Este foi para mim um fecho e uma lição. Das mais bonitas, em terreno fértil para continuar a perpetuar boas memórias, não fosse o Festival Paredes de Coura já um caso sério de amor, sem medos e “sem paredes” como o cartaz da terra o diz.

Texto: Ana Castanho

Fotos: Silvia Lopes @bestivals

ver galeria fotos – Coura sem Paredes, parte II

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